Um estudo recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) escancarou a desigualdade no acesso ao saneamento básico no Brasil: mais de 1,2 milhão de famílias vivem em casas sem banheiro. Entre elas, 83,5% são chefiadas por pessoas negras e 70% por mulheres. No Censo (2022), o número é ainda maior: são 1,37 milhões.
Esses dados revelam mais do que estatísticas. Por trás de cada número, há uma vida impactada. A equipe do Vem Com a Gente, da Águas do Rio, sabe bem o que isso significa. Em agosto de 2022, ela mudou a vida da Dona Rudi, com 62 anos na época, que até então nunca tinha tomado um banho de chuveiro dentro da própria casa.
Transformação que começa pela dignidade
Sensibilizada com a história dela, que tomava banho de caneca com água de chuva estocada no quintal de casa, na comunidade do Pavão-Pavãozinho, a equipe se uniu para comprar um chuveiro e implementar o encanamento até dentro de sua casa. “Os meninos chegaram aqui e fizeram uma arrumação boa para mim”, disse.
Histórias semelhantes são construídas pelas unidades da Aegea todos os dias nas mais de 890 cidades onde a empresa atua. Famílias inteiras que, por meio das redes de serviços de saneamento, passam a ter não só acesso a um banho decente, mas a um vaso sanitário com descarga e com o esgoto seguindo para a rede de tratamento.
Milhões sem banheiro: um problema invisível, mas urgente
O tema para a campanha do Dia Mundial do Banheiro de 2025 é justamente esse: “Saneamento em um mundo em transformação”. Ele traz o conceito de que, mesmo com as constantes mudanças, sempre dependeremos do saneamento para uma vida saudável.
Ainda hoje, segundo a Organização das Nações Unidas, são 3,4 bilhões de pessoas no mundo que não têm acesso ao básico de forma segura e 354 milhões ainda precisam defecar a céu aberto.
No Brasil, 16,3 milhões de famílias moram em casas com algum tipo de inadequação habitacional, segundo dados de 2024 do CadÚnico. Isso inclui ausência de serviços de esgoto (22%, que representa mais de 9 milhões de famílias), falta de água encanada (17%) e de banheiro (3%). Juntas, essas famílias representam quase 40% dos inscritos no Cadastro Único.
O peso da desigualdade tem cor, gênero e CEP
O levantamento mostra que 78% das famílias com pelo menos uma inadequação habitacional são chefiadas por mulheres e 74,6% são lideradas por pessoas negras — número ainda maior que a participação delas no total do CadÚnico (68,8%).
As regiões Norte e Nordeste concentram os piores índices, com destaque para a Bahia, Pará e Pernambuco.
“Os números evidenciam as múltiplas camadas de desigualdades geradas por fatores como raça e gênero, demonstrando que a falta de acesso a direitos básicos incide de formas distintas sobre a população, recaindo com mais intensidade em certos grupos”, afirmou o técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea, Renato Balbim, que assina o estudo.
O autor também ressalta que, enquanto as regiões Norte e Nordeste apresentam maior percentual de famílias negras que vivem em domicílios com ao menos uma inadequação habitacional, a desigualdade de gênero se expressa de maneira homogênea em todo o país.

O que o Dia Mundial do Banheiro nos lembra
O Dia Mundial do Banheiro foi criado pela World Toilet Organization, de Singapura, em 2001. Em 2013 passou a fazer parte do calendário da UN-Water, agência da Organização das Nações Unidas que coordena os esforços da entidade e de outras organizações internacionais nas questões de água e saneamento.
O tema global deste ano, “Saneamento em um mundo em transformação”, alerta para a pressão crescente sobre os sistemas de esgoto e água. Mudanças climáticas, envelhecimento da infraestrutura e investimentos insuficientes aumentam o risco de colapso.
No Brasil, mais de 90 milhões vivem sem coleta de esgoto. A ausência de banheiro vai além do desconforto: representa risco à saúde pública, principalmente de mulheres, crianças e idosos.
Saneamento também é pauta climática e de futuro
O desafio de quem ainda não tem acesso ao saneamento, portanto, não tem banheiro em casa, está sendo um dos pontos muito discutidos na COP30, realizada em Belém (10 a 21 de novembro). No evento da ONU, o tema é destaque em vários painéis.
Já foi tema também em outras COPs. Na 27ª Conferência do Clima da ONU, realizada em novembro de 2022 na cidade de Sharm El Sheikh, no Egito, o caso da Águas do Rio foi mostrado, por Alexandre Bianchini, diretor-presidente da concessionária, como um exemplo positivo do Novo Marco Legal.


