Entrevista a Rosiney Bigattão
Dia Mundial da Água – quais os principais desafios para serem lembrados nesse dia?
A primeira coisa que temos que lembrar é que no Brasil ainda temos quase 35 milhões de pessoas sem acesso à água tratada e ela é considerada uma das maiores descobertas do homem.
A água tratada é diretamente responsável por vivermos tantos anos hoje. A adição do cloro na água e a desinfecção tiveram um impacto gigantesco na história da humanidade neste planeta, que passou a viver mais de 80 anos devido à água tratada.
Quando a pessoa não tem água tratada, o impacto na saúde é evidente, ela acaba perdendo qualidade de vida em todos os aspectos: na educação, no lazer e na produtividade do trabalho. Portanto, a primeira coisa que temos de lembrar no Dia Mundial da Água é de quem não tem. E como é privilegiado quem tem uma água boa na torneira.
A segunda coisa que temos de lembrar é que quando falamos de mudanças climáticas, a face visível delas é na água, com muita chuva ou nenhuma chuva.
As mudanças de clima por excesso de carbono na atmosfera, o aquecimento global, também provocam a desregularização do regime de chuvas no mundo. Lugar que chovia muito não chove mais, enchente em Dubai, no meio do deserto, você vê seca na Amazônia, com nível muito baixo do rio Negro, então tudo isso precisa ser lembrado nesse dia.
Ainda falta consciência que cuidar da água é tratar o esgoto?
Falta muita consciência, principalmente no Brasil. Como a gente passou décadas sem investir em saneamento básico, em muitos lugares as pessoas sofrem por não terem água boa para beber nem esgotamento sanitário. Elas sofrem, mas não sabem que é dali que vêm os seus problemas.
Durante todos os anos que eu viajei o Brasil falando da falta de saneamento, vi que em muitas localidades as pessoas viviam tranquilamente com as diarreias e com as verminoses que afetam as crianças, os idosos, como se fosse normal, porque era tão recorrente, a pessoa nasceu ali e ela não entendia que aquilo era um problema.
Existem pessoas que têm acesso à informação e, por terem água tratada desde que nasceram, nem se apercebem que isso é um bem ainda distante para muita gente, principalmente a coleta e o tratamento de esgoto. Então, falta consciência para as pessoas informadas, que não param para pensar em quem não tem, e para aquelas que não tem e nem sabem que seus problemas derivam de não ter acesso a essa infraestrutura tão elementar.
O abastecimento avançou bastante, mas não a coleta e o tratamento do esgoto. A universalização, tão próxima, é possível?
A água tratada sempre foi a joia da coroa do saneamento. É a parte mais visível, é a parte mais importante, o gestor público que consegue levar abastecimento para um bairro ou um município ganha status e sem água não tem nenhuma atividade humana.
Por tudo isto, a água tratada foi o que mais avançou dos quatros serviços de saneamento ambiental, mas mesmo assim ainda tem cerca de 15% da população sem acesso. Em contrapartida, o esgoto ficou para trás, sempre foi considerado um serviço menos nobre e foi esquecido.
Podemos dizer que nos serviços de água e esgoto existem três degraus: a água, que avançou mais; a coleta de esgoto – em muitos lugares, o esgoto é coletado, mas é jogado em uma fossa, na rua ou em um curso d’água sem tratamento algum, então muito esgoto é coletado, mas acaba sendo descartado na natureza sem passar por uma estação de tratamento de esgoto.
Temos um grande déficit de coleta, que atinge quase 45% da população brasileira, e só metade do esgoto gerado no Brasil recebe algum tipo de tratamento.
Quais as principais contribuições da Aegea nos últimos anos, empresa que teve crescimento acelerado?
Se a gente dividir o tema em problema e solução, a Aegea está ao lado da solução, pois é a maior empresa privada de saneamento, uma das maiores empresas do Brasil e até do mundo em quantidade de pessoas atendidas.
Ao atuar em mais de 500 cidades, a Aegea tem um papel fundamental no atingimento da universalização do país, passa a ser determinante para que o Marco Legal do Saneamento seja cumprido.
A empresa tem concessões mais maduras, como a Águas Guariroba (MS), a Prolagos (RJ), a Mirante (SP), com serviços de esgotamento já universalizados, e agora, mais recentemente, a Águas de Teresina (PI), que atingiu sua maturidade, todas com avanços significativos.
Mesmo a Águas do Rio, com pouco tempo de atuação, já deixa perceptível que, quando o esgoto é bem gerenciado, se consegue melhorias importantíssimas, como a balneabilidade que não se registrava há décadas como a do Flamengo, Botafogo e Ilha de Paquetá, entre outras.
Outras recuperações que valem destaques são a da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio, e a de Araruama, na Região dos Lagos, que voltou a ter fartura de peixes com os investimentos feitos pela Prolagos.
Em Campo Grande (MS), o trabalho da Águas Guariroba resultou na queda de doenças. Tem muitos outros avanços significativos, como os da Águas de Manaus, que levou água tratada, coleta e tratamento de esgoto para as áreas de palafitas. Será mais importante ainda quando a Aegea chegar aos 31 milhões de moradores atendidos que tem hoje.
Quando se diz: a Aegea movimenta vidas, vamos até onde você está, o que está por trás disso?
Eu testemunhei a mudança na vida das pessoas em muitas localidades que receberam os serviços de água e esgoto. Um dos últimos estudos do Trata Brasil, um raio-X sobre quem não tem saneamento no Brasil (“A vida sem saneamento, para quem falta e onde mora essa população”, de novembro de 2023), se comprovou mais uma vez aquilo que já se sabia, mas com dados estatísticos.
O estudo demonstrou que quando a gente fala em não ter saneamento, estamos falando da população mais pobre: aquela mulher negra, mãe, jovem, de periferias ou de favelas, que deixa de trabalhar e de estudar, de tantas vezes que ela tem que levar alguém da família para o posto de saúde ou para o hospital. Isso aumenta a desigualdade do país.
Conforme a Aegea vai chegando, ela vai libertando essa família, principalmente essa mãe, dessa vida de dependência, de servidão de saúde, vamos dizer assim, pois ela está toda hora salvando alguém, como protetora da saúde da família, é a mãe que recebe essa carga de responsabilidade.
Quando chega o serviço, se permite que ela tenha horas de lazer, consiga trabalhar, e a criança e o jovem que viviam doentes, conseguem estudar, trabalhar e passam a ter uma produtividade melhor.
Aquela comunidade passa a ter uma renda melhor porque as pessoas mais saudáveis conseguem melhores oportunidades de emprego, muitas delas são autônomas, dependem de sair de casa para ganhar o sustento daquele dia, quando não conseguem, perdem renda.
Com os serviços de saneamento, o rendimento melhora, fazendo a roda da economia girar naquela localidade, gerando prosperidade. É disso que nós estamos falando: da transformação social que a Aegea traz não só pelo saneamento, mas pelos projetos sociais, de educação e de geração de renda, tudo isso ajuda o trabalho institucional junto aos stakeholders, aos vereadores, prefeitos, agência reguladora, Ministério Público, Defensoria, enfim, toda a sociedade é movimentada quando a Aegea está no município, então, nosso propósito é transformar vidas.